Desespero D'alma


Por Nathália...
...Acordei cedo. Quase não dormi. As visões ainda permanecem vivas. Sobressaltado e atormentado, prossigo em meu caminhar.
Sou fruto de minha angústia e de minha inquietação. Carrego comigo este desassossego, há muito não me surpreendo. Conto as horas, e, através dos dias infindáveis, arrasto-me pesadamente. Sofro, e, se tudo isto não bastasse, sofro ainda mais pelo meu povo, pelo meu país. Como desejaria ver meu povo sorrir! Dos campos e favelas, uma nova raça eu desejaria ver brotar, sobre os muros, uma festa coletiva, um ritual jamais visto eu desejaria ver. Uma grande festa de cores e credos, e, a liberdade de fato, a reger este triunfal renascimento.
Hoje, pude enfim constatar, que serão necessários outros tantos anos para a cura definitiva. A dor que carrego transborda meu ser. Por toda vida estive, e, ainda permaneço mergulhado neste vazio. Deflorado em meu pensar, Devoro o verbo pelo prazer do verso. Destruo a métrica com esta minha tétrica. Vingando o passado, acreditei construir no presente, um futuro laborioso e dele desfrutar. Tal qual um lacrador, amordaço as profecias ou promessas feitas.
Bem sabes como sou. Sou poeta, e, fazendo uso de minhas escribas chulas, vou se iludindo, e fazendo iludir quem às lê. Como um impostor (todo poeta, assim deveria ser chamado), vou me multiplicando para dividir opiniões. Diante de minha implexidade, lorpas e pascácios, acreditam que, de algo sou capaz. Não se confunda. Sou a cara deste Brazil, cru e destemperado, amaldiçoado e improdutivo. Os estágios que a vida ofertou-me foram bastante para minha formação. Freqüentei bordéis e cadeias públicas, bacharelei-me em prostituição e dormi nas praças em meios aos mendigos e drogados. Da forma implorativa, busquei a salvação, entre pernas, declarei poemas, fiz juras e pactos.
Não se confunda diante de minha confusão, e, nem tome estas palavras improfícuas como confissão, pois, se, a isto me prestasse, fatalmente um novo deus inventaria. Assim me faço. Desfaço felicidades e sonhos. Disfarço minha ignorância, separando, a ciência da mente da sabedoria da alma, a doutrina dos olhos da doutrina do coração.
Em meu oceano, recebo todos os rios da maldição. Transbordo o dique de minha revolta, sigo as torrentes e os ventos. Mato-me afogado em meus prantos, assassino a possibilidade, e, de uma forma ilógica, vou renascendo a cada manhã, negando o saber, pois a sabedoria revela o caminho da dor e da amargura.


Ilhabela, 10/1999

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